Autor: Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme - Bacharel em direito pela PUC-SP, Mestrando em Direito pela mesma instituição, membro do conselho científico da Fiuza Editores, Pesquisador do Conselho Editorial da Academia Paulista dos Magistrados ("APM"), Conselheiro do Centro de Conciliação e Arbitragem da Câmara de Comércio Argentino-Brasileira de São Paulo ("CCAB"). Advogado em São Paulo e Professor.
Autor do livro Arbitragem publicado pela "Quartier Latin" e coordenador do livro Novos Rumos da Arbitragem no Brasil publicado pela Fiuza Editores.
A maior alteração ocorrida no direito comercial nos últimos anos, no Brasil, em conjunto com o Novo Código Civil, foi a promulgação da Lei 10.303/2001, dita de reforma da Lei das Sociedades Anônimas. Esta Lei acrescentou ao artigo 109 o parágrafo 3°, o qual dispõe que o estatuto social pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionados mediante arbitragem.
Note-se que a cláusula arbitral constante do estatuto social deve ser explícita quanto às partes e às relações societárias entre elas e sobre os limites da competência arbitral. A respeito da cláusula
compromissória, o Professor Modesto Carvalhosa, já citado em diversos de nossos trabalhos, diz que a questão fundamental gira em torno da identificação das pessoas que se vinculam à cláusula compromissória estatutária, ou seja, quais são as partes que a instituem e se submetem aos seus efeitos. A cláusula compromissória não adquire caráter associativo, conforme o parágrafo 2° do artigo 4° da Lei 9.307/96 "A
cláusula compromissória é a convenção por meio da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam surgir, relativamente a tal contrato. (...) parágrafo 2° Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula", porém vincula a sociedade e, individualmente, os acionistas que a instituíram nos atos de constituição da sociedade ou em alteração estatutária, seja para dirimir divergências e litígios entre eles, acionistas compromissados, e a sociedade, seja para faze-lo nas pendências que entre eles, acionistas compromissados, surgirem no futuro.
Como sugestão, o Mestre Modesto Carvalhosa preleciona que a entidade arbitral deve ser indicada desde logo na cláusula compromissória estatutária, a fim de que, posteriormente, não tropece o compromisso com argüições em juízo. Ademais, é mister analisar a cláusula estatutária no contrato social da Sociedade Limitada, ora regida pelo Novo Código Civil. O artigo 1.053 do Code Civil dispõe: A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único: O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima.
Verifica-se que a nova estrutura adotada pelo Código Civil de 2.002 tende a perdurar as dúvidas que já existiam na anterior vigência do Decreto 3.708/19, a respeito de se identificar as regras das sociedades anônimas passíveis de aplicação às limitadas.
No caso da aplicação subsidiária da Lei das Sociedades Anônimas no contrato social de uma Limitada, tendo como escopo incluir a cláusula arbitral no contrato social é plenamente aceita porque não há conflitos com a estrutura organizacional da sociedade limitada com a sociedade anônima.
Exemplificativamente, não podem ser aplicadas às sociedades limitadas as regras da sociedade anônima atinentes à constituição da sociedade; à limitação de responsabilidade dos sócios; aos direitos e obrigações dos sócios entre si e para com a sociedade; à emissão de títulos estranhos ao capital social, tais como debêntures, partes beneficiárias e bônus de subscrição; à emissão de quotas sem valor nominal; à emissão de certificados de quotas e a subsidiária integral.
De outro lado, são plenamente aplicáveis às sociedades limitadas as regras da sociedade anônima no que respeita, sobretudo, à sua estrutura organizacional, aos direitos, deveres e responsabilidades dos seus administradores.
Por esses critérios, embora não sejam taxativos, permitem ao intérprete guiar-se no caminho da aplicação supletiva da Lei do Anonimato às omissões das regras sobre as limitadas, como no caso em tela aplicar supletivamente o artigo 109, parágrafo 3° da Lei das Sociedades Anônimas no contrato social de uma sociedade limitada, tendo em vista que o critério de razoabilidade permite a aplicação desta regra na outra forma societária.
Fonte: Gazeta Mercantil - Artigo de Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme, publicado em 17/10/2003.